segunda-feira, 27 de junho de 2011

Os pobres que paguem a crise - ou do regresso dos Gulags

Ao que parece o governo prepara-se para propor uma "revolução" no acesso ao apoios sociais do Estado. Cavalgando a onda moralista que se vem instalando há já largo tempo, será novamente proposto, e desta vez aceite no parlamento, que os beneficiários de apoios sociais do estado passem a ter que prestar, como contrapartida, "actividades socialmente úteis". É o já conhecido "Tributo Social" do PSD. Discordo desta medida, não só a um nível filosófico, como, também, a nível prático. Não se deve misturar aquilo que é uma função de redistribuição de rendimentos com o que é do domínio do mercado de trabalho. Se existe a necessidade de gente para prestar "actividades socialmentente úteis" no Estado ou no sector social, nesse caso ofereçam-se contratos de trabalho e respectivos salários como forma de suprir essas lacunas. Poderá eventualmente condicionar-se a continuidade do acesso a apoios sociais à aceitação dos mesmos, mas dentro do quadro do que são normais relações de trabalho. Esta medida, a implementar-se, implicará uma distorção que mais grave é num contexto de elevado desemprego ( e sim, a generalidade do desemprego é involuntário e ocorre pelo simples facto da economia não gerar empregos suficientes. Digam os moralistas o que disserem), como o actual. O raciocínio é simples: Se posso contratar mão de obra por quase nada, porque o irei fazer gastando um pouco mais? Dir-me-ão que a utilização é limitada e que só afectará o Estado e o Sector Social. Reponderei que só beneficiários do rendimento social são mais de 300 mil e que abaixo do limiar de pobreza existem cerca de 2 milhões de nossos concidadãos.Um exército de pobres massivo, pronto a exercer "actividades socialmente úteis"  em troca de meia-dúzia de tostões. Uma espécie de regresso aos Gulags, esses grandes agregados de actividades socialmentente úteis". Particularmente grave é o facto de "As instituições de solidariedade social, como por exemplo as misericórdias, devem ainda ser chamadas a ter um papel activo de fiscalização de proximidade dos beneficiários, estando a ser estudada a transferência para estas instituições de parte das verbas alocadas aos apoios em troca de prestação de serviços. " Uma espécie de Robin dos bosques que tira aos pobres para dar ao Xérife de Nottingham, por forma a pagar-lhe o seu trabalho de vigilância. O Pior é que isto não ficará por aqui. Certamente não faltarão moralistas a clamar em seguida pela instituição dos apoios em espécie, que é para não gastarem tudo o que recebem em vinho. E alguém também se lembrará de que os presos são um fardo para a sociedade e devem pagar a sua generosa hospedagem. E por aí em diante. Não faltará por certo quem lhes faça claque e quem os apoie e quem vá p'ró rossio em manifestações de repúdio pelos indigentes.

Por vezes gostaria que se cortassem os bodes expiatórios de uma vez só: Se expulsassem os  Pretos, os Ciganos, os Brasileiros, os Russos, se exterminassem os pobres e os fracos e que, por Deus, se instalasse uma ditadura, das  rijinhas, pois parece que todos os males de que padecemos resultam da chulice dos que recebem alguma migalha atirada ao vento e, pecado supremo, de termos uma democracia e políticos e partidos! Por certo viveríamos então livres de quaisquer problemas num bem-aventurado oásis de brandos costumes.

O mal neste país é que é tudo uma corja, excepto a malta aqui da mesa. São todos chulos, excepto se estiverem ao nosso lado, nesse caso pouco importa que receba um RSI, porque é bom rapaz e só teve um pequeno azar na vida, ou se tem um arranjo com o patrão e recebe metade por baixo da mesa que assim sempre sobra mais algum no fim do mês em vez de ficar na mão daqueles chulos, ou se se paga sem factura sempre é menos que sai p'ró estado, ou se se metem umas facturas mal aldrabadas na decaração do IRS a ver se se vai buscar todo. Nada disto importa, a não ser que se passe fora do nosso circulo próximo e que, de preferência se resida num bairro social.

Em outros tempos dizia assim a sabedoria popular : "Tirar pouco a quem tem muito e dá-lo por quem não tem . O Rico ficava rico, o pobre ficavam bem"

Hoje em dia, os pobres que paguem a crise. Acostumem-se! 

In the beginning

Diz-se que a primeira medida que um governo toma é exemplar, emblemática e dá o mote para o que será a governação. Felizmente parece que temos um governo centrado no essencial.

segunda-feira, 13 de junho de 2011

mutatis mutandis

O país mudou, ou talvez não. O futuro não é brilhante, mas se pensarmos bem, nunca o foi. Andamos em crise desde 1147, aproximadamente. E sempre a tentar fugir da dita. Primeiro para Marrocos, depois para o mar (África, Índia, Brasil, China, Japão, eu sei lá), depois, sob as cinzas de um império, veio primeiro o Brasil, seguido de uma Europa por reconstruir. Chegamos ao fim da estrada, dizem os velhos do Restelo. Porém eu não vejo o fim de nada, mas antes o eterno retrono à fuga. E agora fica a pergunta: Quem quer ser português? Quem quer abraçar o devir português de fugir à terra pátria, para nessa fuga encontrar a essência da Portugalidade?